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quinta-feira, 12 de março de 2009

Primeira entrevista em nosso blog: Glauco Mattoso!




Inaugurando as entrevistas deste blog, pensei em alguém que fosse a cara de nossa publicação: polêmico, eclético, sarcástico, cruel, crítico e "um amante dos pés"!!!!!!!!!!!!!!! Sua produção literária é rica e, principalmente, abrangente! Conhecido por suas poesias, Mattoso também é um ensaísta e cronista portador de uma particular linguagem! Com imensa satisfação, coloco esta entrevista!


[1] E como está sua vida? E qual sua relação com a realidade onde estamos inseridos? E quais influências ela lhe traz?
GM: Vida de cego não é toda egual. Vida de quem nasceu cego é cheia de phantasias sensoriaes, mas vida de quem ficou cego é cheia de scenas da memoria visual. Um cego nato vive projectando o futuro. O cego perdedor vive recapitulando o passado. Por isso a litteratura e a poesia são as maneiras mais efficazes de registrar taes reminiscencias de forma definitiva. É isso o que venho fazendo no meu computador fallante, onde revivo poeticamente minha passagem pelas subculturas hippy, punk,rockabilly, psychobilly e outras.


[2] Aos 12 anos, lembro-me quando, pela primeira vez, defrontei-me com a"Chiclete com Banana". Era um marvel-maníaco, e meus heróis prediletos eram Demolidor (na época de Miller) e Conan (de Windsor Smith) e de algumas revistas "undergrounds" como a Heavy Metal (lia espantado e comum julgamento conservador). Meu pai chegou em casa, com diversas revistas. E histórias em quadrinhos para mim. Entre elas, a"Chiclete..." Mas, seus artigos e fanzines despertavam interesse para garotos como eu que, ao identificar uma estética, criam uma relação desconfiada e fascinante. Bem, aos 12, encontrara o punk! Conte-nos sua trajetória!
GM: Tambem comecei lendo gibi. Nos sessenta o que circulava mais era PATO DONALD, MICKEY, BOLINHA, LULUZINHA, mas eu preferia SOBRENATURAL eTERROR NEGRO, alem de SOBRINHOS DO CAPITÃO, dois moleques sadicos que inspiraram Angeli a crear os Skrotinhos. A atmosphera de crueldade sempre me fascinou porque, sendo differente e victima de bullying pela pivetada, apprendi a ser masochista. Dahi a ler auctores maldictos como Sade e Genet foi um passo natural. Parallelamente, meu gosto musical passou dos psychodelicos ao punk através da "ponte" transitoria representada por Alice Cooper (na phase "Killer") e pelos New YorkDolls. No cinema, depois de "Laranja Mechanica" nunca mais fui o mesmo, pois aquella lingua na sola reprisava o que eu havia passado debaixo do pé dos pivetes. Desabafei tudo no meu primeiro e principal zine, o"Jornal Dobrabil", cujo anarchismo litterario coincidiu com a attitude punk que começava a pintar nos setenta. Nos oitenta, ja publicando meus livros, participei da "Chiclete" e, nos noventa, ja cego, creei a Rotten com o Portuga. Acho que o cothurno na cara sempre me marcou... (risos)


[3] Lembrei-me do poema "Tramitado", dedicado a José Sarney, e qual sua opinião sobre sua ascensão à Presidência do Senado e um influente cargo para "Fernandinho"?
GM: Não tenho me occupado em attentar para nenhum politico em particular, mas sempre commemoro quando um delles morre, como occorreu agora com o Naya e, algum tempo atraz, com o Malvadeza.
[4] Fico muito impressionado com suas poesias dedicadas às bandas! Ainda mais como "Ruts" e "Demented Are Go"! Mas, ultimamente, lembro-me estar inserido na cultura dark. Conte-nos sua relação com as expressões contraculturais!
GM: Sempre fui beatlemaniaco e viciado em Creedence, mas as bandas obscuras me fascinavam por estarem à margem do successo, como eu mesmo sabia que estaria. Assim, curti os Hullaballoos e o Bobby Fuller nos sessenta; os Dolls do lado gay e a Skrewdriver do lado nazi/homophobo nos setenta; os 4-Skins e os Macc Lads nos oitenta, e assim por deante.Mas continuo muito eclectico, como você notou ao ler o livro "A lettra da lei".

[5] Lembro-me, quando pesquisava expressionismo alemão e brasileiro e, como, além de imergir, vivera uma atmosfera "expressionista" por um tempo. Familiarizara-me com um ambiente sóbrio, cinzento e sensível. E o trecho onde fala dos gabinetes, fora genial para uma exposição poética sobre o Expressionismo. Em uma ironia, não? E como é sua relação com estas vanguardas?
GM: Prefiro as vanguardas mais sujas como o symbolismo, que pesquisam o lado satanico da natureza humana, embora tenha practicado as vanguardas limpas como o concretismo. É que na vanguarda suja consigo achar ternura e na limpa encontro brecha para introduzir a podridão... (risos)

[6] Exponha suas opniões acerca do acordo ortográfico! Como um poeta,que possui uma linguagem própria, diversa do pensamento racional, absorvera este passo?
GM: Até que me considero bem racional, mais apollineo que dionysiaco, e acho que minha opção pela orthographia etymologica tem mais a ver com uma postura philosophica que com o repudio ao accordo em vigor. A maldicção litteraria coincide com a realidade biographica do auctor, e quando adopto a escripta mais archaica sei que lucto contra a maioria, coherente com minha condição de cego excluido e discriminado. Escolher a forma mais difficil de escrever é uma maneira de me rebellar contra os estereotypos da cultura de massa e, ao mesmo tempo, insistir na memoria visual das lettras duplicadas e do "PH". Talvez uma questão de teimosia de alguem que se recusa a acceitar a cegueira.

[7] Lamento o fim da Rotten Records. Afinal, um selo que lançava gêneros musicais na década de 90 e 2000, títulos que, não importando sua tendência, gravavam. E como fora esta iniciativa, em um selo onde lançara álbuns de punk-rock, Oi!, ska, hardcore e psychobilly. Porém, muitas bandas "novas" e marcantes! E fale sobre o CD com o recital de seus poemas!
GM: A idéa da Rotten fez sentido num momento em que fomos os primeiros alançar em CD aquillo que até então só existia em vinyl. No momento em que o proprio CD começa a ficar obsoleto, a Rotten ja não era necessaria. Meu proprio CD com os sonetos musicados, "Melopéa", foi justamente um dos ultimos editados na Rotten com a minha collaboração como co-productor. A partir dahi, o Portuga manteve sozinho o sello até encerral-o no anno passado.

[8] Quais projetos?
GM: Agora que ja ultrapassei os trez mil sonetos, fora outros generos poeticos e ficcionaes, é hora de publicar o que está engavetado. É o que venho fazendo na serie "Mattoseana", coisa que ainda leva annos. Alem disso, continuo servindo de engraxate lingual para os mais differentes estylos de pisantes e rockeiros... (risos)

[9] Forte abraço, agradeço-lhe! GM: Eu idem, pedindo que indique meu sitio e os linques para download domeu CD em MP3. Boas viagens!

Um comentário:

  1. muito legal a entrevista, o Glauco como sempre solicito e simpático. só de curiosidade vou baixar o "Melopea"

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