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domingo, 7 de fevereiro de 2010

Entrevista: Brigada dos Lobos


De Pernambuco, um lobo uivando Oi!, nas noites da periferia de Recife, acompanhado de uma horda dionisíaca, como hóplitas em marcha! Apresento-lhes Brigada dos Lobos, uma das mais novas e originais bandas no cenário Oi! nacional. Um som pesado e denso, aliado à vocais roucos e excelentes letras. Em um país, onde nasceram Garotos Podres, Vírus 27, Histeria Oi!, Carbonário e Dose Brutal, encontramos uma nova geração de skins, portadores de suas perspectivas. Drak e Eva respondem à minhas perguntas!

1) Não faz muito tempo que conheço vocês. Um amigo da Brutal 420 indicou-me seu som, e não pude acreditar no que defrontei-me! Apresentem-se à nossos leitores e falem um pouco sobre os integrantes, suas atividades extra-banda, por favor.

Conhecemos Zé Colmeia de longa data, Drak particularmente troca idéia com ele por email há um bom tempo já.
Antes de tudo, obrigado pelo espaço. Para nós é uma honra ter uma entrevista divulgada num blog de tão boa qualidade, como o seu, que trás na bagagem bandas incríveis como o kalevalan viikinginit, isso sem mencionar seu excelente trabalho, já antigo, com zines.
De forma sucinta a banda tem 5 membros, cada um deles contribui com todo seu universo simbólico para a composição final, em termos de harmonias e letras.
O vocalista, Vela, é de origem portuguesa, mas já mora nas terras de cá há bastante tempo. É professor de literatura, tem planos de abrir um restaurante temático lusitano. Responsável por excelentes letras como “Outra Cerveja já Foi”, “Me Enterrem de Botas” e “De volta as Ruas”, ele é a centelha da tradição skinhead crua pós 80’s em nossa banda.
Renato, que perambula entre a bateria e o segundo vocal, tem planos de acrescentar instrumentos clássicos ao som da banda. Com grande veia poética e refinado gosto literário, é estudante de Filosofia e, nas horas vagas, cuida da disciplina nos ônibus da região de Olinda. Também toca na banda Escuderia, novo projeto da cena oi! independente de Recife.
Hallan é o homem banda. Capaz de tocar todos os instrumentos, às vezes até dois ao mesmo tempo, se deixarem. É responsável por algumas das nossas melhores composições melódicas. É soldado convicto do oi! e não leva desaforo para casa. Toca também na banda Subversivos, que é um dos pilares da cena de rua de Recife.
Eva, a competente e criativa baixista, uma das grandes mantenedoras do orgulho desta cena. Praticamente capaz de mobilizar uma segunda queda da bastilha se o motivo for justo. Impecável zeladora da tradição skinhead e exemplo de militância contra-cultural a ser seguida. (eu sou suspeito para falar...) Eva trabalha no comércio de livros e é aplicada estudante de História.
Drak é o ideólogo, a veia da racionalidade, gerador e produtor de zines, seus textos são capazes de converter uma nação. Durante muito tempo, foi o único skin no Recife. Astuto mobilizador intelectual (sou suspeita para falar...), é também o responsável por letras e arranjos melódicos como “Marcha dos Licantropos” e “kali”. É formado em Sociologia e trabalha atualmente como agente de pesquisas.

2) Por que Brigada dos Lobos? Em sua página, existem relações com druidismo. Onde estariam as manifestações desta no imaginário da banda? Por sinal, bastante rico! Além das crenças pagãs, quais referências a banda possui?

O lobo para nós representa um totem, um gerador de ressonâncias arquetípicas. Também encarado como metáfora da construção de uma individualidade livre diante da decadência da sociedade de massas e a certeza de que viver em nossos tempos é travar uma batalha cotidiana pelo nosso direito ao Espírito. A metáfora do lobo, nesse sentido é para nós um instrumento de guerrilha ontológica.
Primeiro, existe uma grande identificação dos membros da banda com mitologemas e simbolismos arcaicos. Buscamos nos calcar dentro de uma perspectiva identitária através de uma arqueologia étnica de componentes olvidados, mas que pertencem a gênese da ancestralidade de nossa região, Nordeste.
Nesse sentido, buscamos recompor, mesmo que de forma mimética, dentro do nosso contexto e possibilidade, aqueles fundamentos celtiberos e andalusos, gérmens do ethos lusitano. Uma de nossas matizes, ou uma das matizes com a qual nos identificamos (cujos resquícios são encontrados no imaginário e nos saberes tradicionais do homem sertanejo) e que é demasiadamente subvalorizada e estigmatizada em função do ranço anti-colonial dos discursos nacionalistas e esquerdistas. Estes, ao desprezar o valor cultural do vetor étnico mencionado acima, em função da construção de uma plástica e conveniente identidade brasileira, jogaram a água da banheira fora com o bebê dentro.
Isso tudo está diluído na sonoridade marcial, nas metáforas em nossas letras e na energia que nos motiva individualmente a produzir contra-cultura.



3) Quais bandas influenciaram seu som? Além do Oi! e do punk, vejo que possuem interesse pelo metal. E o que cada integrante da banda aprecia?

Como um projeto composto por indivíduos, não somos unânimes, enquanto grupo, em nossas preferências. Coletivamente existem alguns consensos como Last Resort, Camera silens, Bandas inglesas clássicas, Motorhead, Paris Violence, música folk( e viola nordestina como um todo) e alguma coisa de Psychobilly.
É difícil resumir o gosto de cada um, uma vez que o ecletismo aqui, individualmente vai do Fado ao Black Metal, do Northern Soul à Música clássica. Mas vamo lá, Já dissemos antes que Vela é mais ligado ao som do oi! cru oitentista, curte Last Resort, Oppressed e coisas mais recentes como Evil Conduct e Perkele; além de ser apreciador da boa música Portuguesa por herança familiar e identificação. Eva gosta de som oi! Francês dos anos 80 e 90, Alton Ellis, gosta de reggae antigo, dub, La souris deglingée, The Who, som inglês dos anos 60, Bohse Onkelz, rock progressivo, hard rock, thrash metal, DIO e Iron Maiden. Hallan gosta de Adicts, English dogs, Motorhead, Misfits, gosta bastante de bandas Psycho como Koffin kats e do velho e bom Jhonny Cash. Renato gosta da cena oi! alemã, coisas como Freiwild, Loikaemie, cena sueca, bandas como Ultima Thule, Koorpiklaaani(folk metal), Paris Violence( todos os álbuns), Heitairoi e Ulver(raw Black metal). Drak escuta Rock identitário de cenas variadas, com ênfase nas cenas de folk metal russa, bandas como Arkona, Svarga, Kalevala, Butterfly Temple; Finlandesa, Moonsorrow; Sueca, Enhärjarna, Manegarm; francesa, Pest Noire, Blut aus Nord, Alcest; Gaélica, Aes Dana, Heowl Tewen; Black Metal norueguês dos anos 90, Ulver, Darkthrone, Mayhem; Doom, Agalloch, cancioneiro tradicional Irlandês, Português e Nordestino; música sufi e hassídica.

4) Conheço pouca coisa sobre a cena skinhead no Nordeste, embora seja um fã das bandas punks antigas desta região de nosso país, como Misantropia, Karne Krua, Estrago e Babylóides. Quanto ao Oi!, lembro-me apenas dos Voluntários. Conte-nos como vive um skinhead em Pernambuco.

Falando pelo nosso estado é verdade, podemos dizer que por muito tempo houve apenas um protótipo de cena skinhead, sempre houveram indivíduos isolados que tinham identificação por oi!, ou ska, mas esses só vieram se encontrar em meados de 2004, como o primeiro projeto oi! de recife o Brigada oi! formado por Drak, Camilo(Subversivos), Eduardo Rude(antigo Hidrofobia, hoje dono da marca rude boy t-shirts ) e Tiago Rabelo (Medonhos). Das cinzas desse projeto migraram através de Drak algumas músicas antigas para o Brigada dos Lobos, como “Aos sectários” e a famigerada “Anauê é o meu caralho!” O Subversivos, mítica banda de nossa cena, foi a primeira a apoiar a estruturação de uma cena oi! em Pernambuco acolhendo skinheads, antes isolados, em sua crew e aderindo a uma sonoridade oi! em suas músicas, além de sempre intervir física e verbalmente em gig’s, ruas e mesas de bar e onde quer que surgisse idéias preconcebidas, polêmica e contra-informação sobre a cultura skin. O Brigada dos Lobos surge em 2007 a partir do encontro de quatro amigos que se conheceram por compartilhar da identificação com a cultura skinhead e que encontravam, pelo background já citado, um ambiente propício, porém sempre dando de cara com a resistência do senso comum estúpido dentro e fora do ambiente subcultural.
Ser Skinhead em Pernambuco é honrar um nome que foi construído nas ruas através de duras penas e participação ativa na vida contracultural de Recife, respeito aos que vieram antes, suporte aos que vieram depois, sempre num espírito de Cooperação, Independência, Autonomia e Identidade. Graças a isso estamos construindo nosso lugar na cena de Recife e de Pernambuco.
Por outro lado, para o senso comum da sociedade Pernambucana, um skinhead não passa de um fanático racista, que por sabotagem da mídia e reprodução de discursos estereotipados é estigmatizado publicamente.

5) E seus shows, como está a receptividade do público, com um empolgante som e letras inteligentes?

Nossos shows tem tido uma boa recepção dentro do que se pode esperar de uma cena em construção. É basicamente freqüentado pelos skins locais e por amigos de outras vertentes dentro do rock de rua. Geralmente nossos eventos são organizados com bandas amigas, como Nômades, Subversivos, Punkadaria e bandas de fora do estado, como o Misantropia e o Anorexia, visando fortalecer a união de bandas independentes e não sectárias do Nordeste.

6) Algumas estrofes de seu cancioneiro despertaram meu interesse. Gostaria que comentassem sobre "...vida honesta e trabalhadora, sob o elmo troiano"; "...sangue antigo, herança ancestral" e "Quando tudo era noite, e a unidade dormia". Este último, gostaria de que comentassem mais sobre que unidade estava "dormindo". Acreditam na existência de alguma unidade, ou compartilham perspectivas de Nietzsche, no tocante ao fim destas na modernidade?

Bom sobre “vida honesta e trabalhadora, sob o elmo troiano”, em primeiro lugar, digo que remete a nossa condição biográfica materialmente falando. Gostamos de celebrar o fato de estarmos juntos e de compartilhar os códigos da subcultura onde transitamos. Do combustível que ela fornece ao desenvolvimento de nossa individualidade e da força que encontramos ombro a ombro. Queria ressaltar que o termo “elmo troiano” para nós passa por uma reterritorialização que mais nada tem a ver com tomadas de posições politicamente convenientes e defensivas ou auto-afirmação de facções pueris, para nós o elmo troiano (poderia ser lido até espartano, risos) representa o caráter Marcial que é essencia da cultura Skinhead, e mais que isso, faz dela uma Contra-cultura, a vontade e a disciplina de aniquilar em si mesmo aquilo que te torna fraco(em todos os sentidos).
“...sangue antigo, herança ancestral”, sobre essa passagem, é preciso contextualizar dentro da temática do que representa a figura do “Licantropo” para nós, que é análoga ao Übermensch de Nietzsche. Feito isso usamos a metáfora do sangue como expressão do espírito e este como parte de uma linhagem de seres que não se deixam trucidar pela prisão ontológica da sístase em que o tipo humano está mergulhado. Se as massas se destinam à aniquilação, nós buscamos a resistência, escolhemos o lado do lobo ao da ovelha.
“Quando tudo era noite e a unidade dormia”; bom, aqui eu me remeto a concepções gnóstico-cabalísticas sobre existência negativa, você pode encarar essa passagem como a noite de Brahma( Kalpa-Pralaya: ciclo onto-nihílico do cosmodrama indo-ariano onde o cosmos ordenado entra em um movimento de contração, sobrando apenas o vazio do caos primordial) e pode encarar o termo “unidade” a partir do conceito de Demiurgo utilizado na escola gnóstica Valentiniana, o qual trocando em miúdos refere-se ao Ego. E sim, este se pretende como unidade, quando na verdade é uma hipóstase estratificada em fragmentos que simulam existência, como bem demonstrou o Dr. Jung.

7) Qual sua discografia disponível? Lançamentos para o futuro?

Estamos finalizando a prensagem do nosso primeiro álbum, que possivelmente se chamará “Orgulho, Força e Identidade”. Já temos material para um segundo álbum, mas isso requer maiores custos com gravações, além do que achamos que as faixas que compõem este primeiro álbum sintetizam bem a primeira fase e proposta inicial da banda. Estamos participando da articulação de uma coletânea em vinil com as bandas Brutal 420(RJ), Expulsos do bar(ES) e Arroto(RJ), além disso estamos também planejando lançar um split com a banda Alagoana Anorexia através do selo Bota Suicida. Por enquanto é isso.

8) Palavras finais?

Desenvolva a cena de seu estado, sem sectarismo. Crie uma estrutura mínima que permita a auto-gestão dessa cena. Produza, debata, lute pela independência e autonomia da cultura skinhead. Novato, respeite e busque a orientação dos mais antigos, mas nunca deixe de pensar por si e seja antes de tudo honesto consigo mesmo e em suas intenções dentro desta cultura. Não se deixe cooptar por ladainhas ideológicas auto-interessadas, esmague os patrulheiros ideológicos de esquerda e de direita e sua rebeldia fetichizada. Preserve a tradição cultural de sua região e redescubra sua ancestralidade étnica, o skinhead é no mundo todo, também, um canal de expressão desta. Fuja do senso comum homogeneizado pela mundialização da cultura e lute contra o nivelamento étnico global. Repudie o “folclore do exótico” fundamentado na visão que o estrangeiro tem de nós, rejeite a cultura regional de tipo “exportação”, pois ela é mero produto mercadológico, busque as verdadeiras raízes, saberes e imaginário de seu ethos. Tenha coragem, atreva-se a ir contra a corrente do pensamento único e do discurso “politicamente correto” que nada tem de contracultura, apenas tenta recodificá-la, digeri-la e acomodá-la pelo poder centralizador. Direita e esquerda são as duas faces de uma mesma moeda, os dois pólos de uma única bateria que serve para alimentar o sistema; o direito de exercer sua individualidade fora de moldes consensuais lhe é inalienável, acreditamos que a única militância válida é aquela que te permite ser você mesmo entre os seus.

9) Muito obrigado!

Nós que agradecemos pelo espaço mais uma vez, Pierre. E te parabenizamos pela sua iniciativa e empenho construtivo na cena skinhead. Continue com o bom trabalho e lutando o bom combate.
Para conhecer o som do Brigada dos Lobos, acessem www.myspace.com/brigadadoslobos
Eles também editam o fanzine "Longa Noite do Skinhead". Caso queiram uma cópia, escrevam para o mail tebraruna@hotmail.com

5 comentários:

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  4. Respeito Drak pela sua postura e maneira de se impor, sempre moderado e coerente com suas idéias, expondo-as de maneira clara, definindo seu carater sólido...

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